Como comentei no capítulo Pessoas: prioridade nº 1, sempre nós gastamos dinheiro e energia para adquirir e reter as melhores pessoas. Ter as pessoas como a prioridade número 1 é a chave para atingir qualquer outro objetivo. E o primeiro passo para ter as melhores pessoas no seu time é a contratação.
O trabalho de contratação de pessoas deve ser feito em conjunto com o RH. É um trabalho em equipe. Já vi situações em que esse processo é totalmente delegado para o time de RH, e a pessoa que está contratando fica apenas perguntando “cadê os candidatos?” e “por que o RH está demorando tanto para preencher essa vaga?”. Definir perfil, encontrar candidatos, entrevistar, selecionar, fazer onboarding é tanto responsabilidade do RH quanto do head de produto e de seu time.
O primeiro passo para contratar as pessoas certas para o seu time é definir o perfil de quem você está procurando para se juntar ao time. Quando falo de perfil, estou pensando não só em conhecimento técnico como também em senioridade comportamental e fit cultural, ou seja, que valores a pessoa precisa ter para trabalhar nesse time. É importante construir esse perfil em colaboração com mais pessoas do time. Desse perfil, sairá a descrição da vaga, ou job description em inglês.
Tendo o perfil definido, é preciso anunciar a vaga a trazer candidatos. É o trabalho de atração de pessoas. Aqui o marketing pode ajudar. Da mesma forma que precisamos contar ao mundo sobre o problema que resolvemos com nossos produtos e como o produto o resolve para encontrar as pessoas certas que terão interesse em virar nossos clientes, precisamos contar ao mundo sobre o tipo de pessoa que precisamos em nosso time.
Para isso, é importante fazer um trabalho de employer branding, que é contar por que a sua empresa é uma empresa interessante na qual trabalhar. Contar nas redes sociais e em eventos sobre os trabalhos feitos pelo time, os desafios e as conquistas, como é o ambiente e a cultura do time. Isso tudo faz parte do employer branding e ajuda a atrair pessoas interessadas em trabalhar no seu time de desenvolvimento de produto. Esse é um trabalho feito em parceria entre RH, marketing e o time de desenvolvimento de produto.
Outra excelente fonte de novas candidaturas são as indicações internas. Peça para as pessoas do time indicarem pessoas com quem trabalharam em outros lugares e com quem eles gostariam de trabalhar de novo. É possível inclusive incentivar essas indicações dando prêmios para quem indicou caso a pessoa indicada seja contratada.
É importante ter a sequência de entrevistas bem definida. Quem são as pessoas que vão entrevistar? Em que ordem? Serão entrevistas individuais ou em grupo? Haverá resolução de caso? Normalmente, nas empresas em que trabalhei, a primeira entrevista é feita pelo RH, para apresentar a vaga e a empresa e para entender um pouco mais do perfil comportamental da candidata. O RH pode usar algum teste comportamental para isso.
Em seguida, vêm as entrevistas com as pessoas do time de desenvolvimento de produto. Se for uma contratação para uma posição que vai interagir bastante com outras áreas da empresa, é importante que a candidata também seja entrevistada por pessoas dessa outra área. Normalmente sugiro que o líder direto seja o primeiro a entrevistar, em seguida que a pessoa seja entrevistada por pares do time de desenvolvimento de produto e de outras áreas, se for o caso.
Se a pessoa for liderar um time, sugiro a oportunidade de algumas pessoas do time também entrevistarem. Apesar de deixar o processo mais longo, acho interessante mais pessoas entrevistarem por dois motivos: primeiro, dá a oportunidade de mais gente conhecer os candidatos e, quando a decisão for tomada, mais pessoas estarem comprometidas com o sucesso desse novo membro do time; segundo, dá a oportunidade de a candidata conhecer melhor a empresa e as pessoas que compõem o time.
Uma dica importante para quem entrevista é procurar fazer as mesmas perguntas para todos os candidatos, assim você poderá comparar as respostas para escolher aquela que mais se encaixa no perfil que você está buscando. Em relação a que tipo de perguntas fazer, costumo ouvir a história da pessoa e perguntar sobre acertos, erros, relação com outros membros do time e com pessoas de outras áreas.
Durante o processo de entrevistas, pode ser interessante pedir para a candidata resolver um problema em casa para depois ela apresentar a solução. Esse processo é bastante comum tanto em vagas de gestão de produto, como de UX e de engenharia. O objetivo desse teste é conhecer melhor a capacidade de resolução de problemas, bem como de apresentação de soluções. E essa apresentação da solução é uma boa oportunidade para entender como a pessoa se expressa e como ela lida com questionamentos.
Acho interessante o caso a ser resolvido ser um caso prático da empresa, em que o time está trabalhando ou pretende trabalhar em algum momento. Já ouvi críticas de que isso é consultoria gratuita e que depois a empresa vai usar a melhor solução. É importante deixar claro que a resolução de case tem dois objetivos, dar a oportunidade de as pessoas que estão contratando conhecerem melhor o candidato, como ele resolve problemas e apresenta suas soluções, assim como dar ao candidato a oportunidade de conhecer que tipo de problemas ele vai encontrar no dia a dia.
Vale ressaltar que ao pedir uma resolução de caso, há o perigo de perder candidatos. Por isso, é importante deixar claro que o processo terá essa fase, e é importante encantar o candidato antes de apresentar o caso a ser solucionado para deixá-lo com vontade de resolver o caso.
Como comentei, esse é um processo longo, com várias entrevistas e testes, o que pode fazer você perder boas candidaturas. Por isso, é importante manter esse processo atraente, contar à candidata como ela está indo, em que fase ela está e o que falta para chegar ao final do processo. Já ouvi relatos de empresas que conseguem fazer esse processo todo em um dia, chegando ao final do dia com candidatos recebendo uma proposta, mas nunca tive a oportunidade de presenciar um processo assim.
Após as entrevistas e os testes, chegou o momento de escolher a melhor candidata. A melhor forma de fazer isso é juntando as pessoas que entrevistaram os candidatos para contarem suas impressões sobre cada um, assim a líder da vaga pode tomar a decisão sobre quem escolher. A decisão de quem contratar é da líder que tem a vaga aberta, mas esse momento para trocar percepções é importante. Costumo chamar essa reunião de comitê de contratação, que dá a oportunidade não só de escolher o melhor candidato, como de entender melhor como as pessoas estão fazendo o processo de entrevista e, eventualmente, alinhar alguns pontos em relação a esse processo. Isso deixa os membros do time mais engajados com o sucesso da pessoa que será contratada.
Uma vez definida quem é a pessoa, é preciso desenhar a proposta que será feita para ela. É importante que a proposta seja financeiramente relevante. Não é comum a pessoa aceitar receber menos do que ela está recebendo atualmente. E é importante balancear incentivo de curto prazo (salário e benefícios), médio prazo (bônus) e longo prazo (stock options e similares). Cuidado para não fazer uma oferta que seja muito discrepante com o que as pessoas atuais do time já têm, para não criar diferenças que podem minar o trabalho em equipe.
Supondo que a candidata aceitou a proposta, chegamos a uma nova fase do processo, o de onboarding, ou seja, o de trazer a pessoa para o time e fazê-la parte desse time. O RH vai cuidar da parte mais burocrática desse processo, mas é preciso também desenhar com o RH todo o onboarding para garantir que a contratada se sinta acolhida e entenda mais sobre a empresa, o time e os desafios que ela terá pela frente.
Na Conta Azul tínhamos um processo muito bacana de onboarding, coordenado pelo RH, onde todos os novos funcionários passavam por uma semana de imersão para conhecer todas as áreas da empresa e os principais membros dessas áreas. Em seguida, as pessoas tinham um onboarding local, no time do qual elas fariam parte. No Gympass, além do onboarding, todas as pessoas eram convidadas a participar de algumas ativações, que era o momento em que íamos a um cliente para apresentar o benefício do Gympass para seus funcionários. É importante dar à nova pessoa que está entrando no time a oportunidade de conhecer mais sobre as outras áreas da empresa e sobre o cliente, antes de ela começar a trabalhar.
Conversas do RH com a pessoa após 45 e 90 dias que a pessoa foi contratada podem ajudar a perceber pontos de melhoria nesse processo de onboarding. Esses primeiros dias da pessoa no seu novo time são fundamentais para o sucesso da relação futura, por isso é importante monitorar de perto.
O título deste capítulo é Contratar as pessoas certas, mas não basta só contratar, é preciso também cuidar das pessoas durante todo o tempo que ela estiver no time.
Escrevi um capítulo inteiro sobre Feedback e avaliação de desempenho, mas quero pontuar aqui, pois feedback é algo muito importante para as pessoas que fazem parte do seu time. Como elas poderão saber que estão no caminho certo? No que elas podem melhorar? O que eles estão fazendo e que devem continuar fazendo? O que elas não estão fazendo e que deveriam fazer? O que elas estão fazendo e que elas deveriam parar de fazer?
É muito importante deixar claro para cada pessoa do seu time sobre esses pontos. E é muito importante lembrar que feedback é uma via de mão dupla, ou seja, você também deve procurar saber o que você pode fazer para ajudar a pessoa.
Eventualmente você pode tomar a decisão de desligar alguém, o que é conhecido como turnover involuntário, ou alguém do seu time pode tomar a decisão de sair do seu time, o turnover voluntário. Esse sempre é um momento difícil, de ruptura, mas importante entender os motivos que acabaram fazendo chegar nessa decisão. Poderia ser evitado? Se inevitável, poderia ter acontecido de uma maneira mais planejada, evitando disrupção para o time?
No próximo capítulo, vamos entender como fazer feedback e gestão de desempenho.
Este artigo faz parte do meu mais novo livro, Liderança de produtos digitais: A ciência e a arte da gestão de times de produto, onde falo sobre conceitos, princípios e ferramentas que podem ser úteis para quem é head de produto, para quem quer ser, para quem é liderado por ou para quem tem uma pessoa nesse papel na empresa. Você também pode se interessar pelos meus outros dois livros: