Afinal, com o uso da escrita as pessoas deixarão de exercitar a memória.
A escrita é uma ameaça à memória viva e à transmissão oral do conhecimento, que permitem o debate, a reflexão ativa e o verdadeiro aprendizado.
Parece loucura dizer isso, né? Só que Sócrates dizia isso sobre a escrita. Tanto que não deixou nada escrito. Tudo o que sabemos sobre ele foi registrado de forma escrita por Platão e outros discípulos.
Hoje, essa crítica soa absurda. A escrita é a base da nossa cultura. Foi ela que permitiu a transmissão de conhecimento por gerações, o avanço da ciência, o surgimento das universidades, da imprensa, dos livros, da internet.
Mas essa reação de Sócrates não é um caso isolado.
Sempre que surge uma nova tecnologia que transforma a forma como pensamos, aprendemos ou criamos, ela provoca medo e resistência.
Quando Gutenberg inventou a prensa, houve quem temesse que a multiplicação dos livros ameaçasse a ordem social, espalhasse ideias perigosas e enfraquecesse a tradição oral — exatamente como Sócrates temia. No entanto, a imprensa se tornou a base para o avanço do conhecimento, da ciência e da educação como conhecemos.
Quando surgiram os GPS nos carros, diziam que as pessoas deixariam de saber se orientar sozinhas. E quando a televisão foi inventada, previram que ninguém mais iria ao cinema nem ouviria rádio.
Essas preocupações até faziam sentido no contexto de cada época. Mas hoje vemos que essas tecnologias não destruíram o que existia antes — elas mudaram o jogo, forçando adaptações, abrindo novos caminhos e expandindo nossas possibilidades.
A escrita também é uma tecnologia. Ela não nasceu com o surgimento do homem — foi criada, desenvolvida e incorporada à nossa forma de pensar ao longo de séculos. E nós, como seres humanos, não nascemos sabendo ler e escrever — nós aprendemos a tecnologia da escrita na escola.
E é exatamente isso que está acontecendo agora com a inteligência artificial. A IA está sendo vista como um risco:
Da mesma forma como a escrita foi vista por Sócrates e outras pessoas que pensavam como ele. Contudo, a IA, assim como a escrita, é uma ferramenta de expansão — não de substituição. Como toda tecnologia poderosa, ela tanto pode nos emburrecer quanto nos fazer pensar melhor. A chave está em como decidimos usá-la: de forma passiva ou intencional e crítica, como uma ferramenta para enganar o sistema ou de ampliação de nossa capacidade criativa.
Muito provavelmente, daqui a algumas décadas, acharemos tão absurdo temer a IA quanto hoje achamos estranho que alguém tenha dito que a escrita acabaria com a sabedoria.
Tudo!
Como pessoas de produto, somos constantemente desafiados por novas tecnologias. IA, Realidade Virtual e Aumentada, Blockchain, novas linguagens, novos frameworks — e, mais recentemente, o boom da IA generativa.
Mas talvez estejamos olhando para a IA do jeito que Sócrates olhou para a escrita: com medo de que ela substitua o trabalho de product managers, desingers e engenheiras.
Só que essa não é a forma como devemos encarar IA. Ela é uma tecnologia, uma ferramenta para potencializar o nosso trabalho, para nos ajudar a melhorar o desenvolvimento de produto em várias frentes:
Como toda tecnologia, o que ela entrega depende de como a usamos. Se a usarmos de forma intencional e crítica, com contexto e propósito, ela pode elevar o nível daquilo que fazemos — e daquilo que somos capazes de imaginar, da mesma forma que a escrita nos trouxe até aqui.
Eu mesmo tenho experimentado isso na prática. Nos últimos meses, tenho usado IA como uma espécie de thinking partner — uma ferramenta para estruturar ideias, destravar raciocínios e revisar textos como este. A IA não escreve por mim, mas me ajuda a pensar, testar caminhos, refinar argumentos e ganhar velocidade. E isso tem sido valioso não só para escrever melhor, mas para pensar produto com mais clareza.
No futuro, certamente parecerá absurdo imaginar fazer produto sem IA — assim como hoje seria absurdo imaginar fazer produto sem escrita.
E para chegar nesse futuro — como Sócrates e Platão nos ensinaram — devemos seguir questionando, experimentando e aprendendo, usando essa tecnologia como ferramenta potencializadora de nossas capacidades
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