No primeiro artigo da série sobre IA e gestão de produtos escrevi que:
IA não é só sobre produtividade: é sobre criar produtos melhores. Por produtos melhores, quero dizer produtos que resolvem melhor o problema da cliente enquanto geram resultados melhores. IA é mais uma tecnologia que devemos conhecer e ter em nosso “cinto de ferramentas” para nos ajudar a criar produtos melhores.
Contudo, isso não significa que todas as funcionalidades de nossos produtos devem ter IA, pois IA é uma tecnologia que produz soluções probabilísticas.
Uma solução probabilística é aquela que, ao receber os mesmos dados de entrada, pode gerar resultados diferentes em execuções distintas, porque seu funcionamento envolve modelos estatísticos ou algoritmos que lidam com incerteza.
Em vez de retornar uma resposta exata e única, ela retorna uma estimativa baseada em probabilidades. Por exemplo: “há 82% de chance de este imóvel interessar a você” ou “o modelo prevê chuva com 70% de probabilidade amanhã”.
Por outro lado, uma solução determinística é aquela em que, dada a mesma entrada, o sistema sempre retorna exatamente o mesmo resultado. Ela segue regras e cálculos pré-definidos, sem envolver incerteza ou estimativas. Não há espaço para variação aleatória ou probabilidade: a saída é previsível e reproduzível.
Abaixo, um resumo das diferenças entre soluções determinísticas e probabilísticas:
Determinístico | Probabilístico |
---|---|
Sempre dá o mesmo resultado para a mesma entrada | Pode variar, pois trabalha com estimativas |
Baseado em regras fixas e fórmulas | Baseado em padrões e inferências de dados |
Mais barato e previsível | Mais flexível e adaptável a situações complexas |
Ideal para cálculos, validações e controle | Ideal para previsões, recomendações, personalização |
Por exemplo, na nossa conta bancária, queremos ter certeza absoluta de que o saldo é R$ 100,00. Não queremos que o saldo tenha 95% de chances de ser R$ 100,00, com 5% de possibilidade de ser outro valor. Por outro lado, faz sentido que as recomendações de investimento sejam probabilísticas: “pessoas com o seu perfil de ganhos e gastos têm 77% de probabilidade de investir no fundo X e 73% de probabilidade de investir no fundo Y.”
Para pessoas gestoras de produto, entender essa diferença é essencial para decidir onde a IA realmente agrega valor, e onde uma solução determinística simples é mais eficiente, mais barata e mais confiável.
Adicionar IA a uma funcionalidade que não precisa dela aumenta seu custo, sua complexidade e os riscos de performance, de explicabilidade e até de conformidade. Por isso, escolher a tecnologia certa para solucionar cada problema é parte do trabalho do time de desenvolvimento de produto.
Antes de adicionar IA a uma funcionalidade, vale se perguntar:
Em muitos casos, uma regra determinística simples cumpre o objetivo de forma mais barata, previsível e confiável.
Decidir entre solução determinística e probabilística é parte do trabalho de escolher a tecnologia certa para cada problema, equilibrando valor para a cliente, impacto no negócio, custo e risco.
Relembrando o exemplo do artigo anterior, do algoritmo de imóveis similares da Lopes, a versão inicial era determinística, uma vez que sugeria imóveis similares baseados somente em 3 variáveis estáticas (localização, tipo e valor), o que limitava bastante sua precisão. Com esse algoritmo determinístico, 28% dos imóveis acabavam sem nenhum imóvel similar.
Quando resolvemos criar um novo algoritmo de imóveis similares, ampliando a análise de três para dez variáveis estáticas, com técnicas de machine learning, ou seja, aprendendo quais imóveis eram mais clicados e usando essa informação para as próximas recomendações, estávamos criando uma solução probabilística.
A nova versão do algoritmo é probabilística porque deixou de seguir apenas regras fixas e passou a aprender padrões de comportamento dos clientes. Em vez de simplesmente comparar variáveis estáticas (localização, tipo e valor), ele observa quais imóveis eram mais clicados por pessoas interessadas em um determinado imóvel e usa essa informação para calcular a probabilidade de relevância de outros imóveis. Assim, as recomendações não eram mais uma lista estática, mas um ranking dinâmico, ordenado pelas maiores chances de atrair o interesse da cliente. Esse tipo de abordagem é típico de machine learning: duas execuções com a mesma entrada podem gerar resultados diferentes à medida que o modelo é atualizado ou que novos dados de interação são incorporados.
Entender essas distinções evita cair na armadilha do hype e ajuda as equipes de produto a focarem em onde a IA realmente faz diferença.
No próximo artigo vamos falar sobre a diferença entre IA analítica e IA generativa. Spoiler, já estamos usando IA analítica há muito tempo!
Ajudo empresas e lideranças (CPOs, heads de produto, CTOs, CEOs, tech founders e heads de transformação digital) a conectar negócios e tecnologia por meio de treinamentos e consultoria focados em gestão de produtos e transformação digital.
Na Gyaco, acreditamos no poder das conversas para provocar reflexão e aprendizado. Por isso, temos três podcasts que exploram o universo de gestão de produtos por ângulos diferentes:
Você trabalha com produtos digitais? Quer aumentar as chances de sucesso do seu produto, resolver os problemas das usuárias e atingir os objetivos da empresa? Conheça meus livros, onde compartilho o que aprendi ao longo de mais de 30 anos criando e gerenciando produtos digitais: