Durante mais de 30 anos liderando times em empresas de tecnologia, já vi e senti os efeitos de algumas crises e recessões. De acordo com a Wikipedia, desde 1990 foram 4 recessões nos EUA, sendo a mais recente a da COVID-19 no início de 2020. De acordo com o modelo de probabilidade de recessões da The Conference Board, uma organização global sem fins lucrativos de pesquisa sobre cenários futuros, estamos na beira de mais uma recessão:
Downsizing e layoffs são ferramentas comumente utilizadas em momentos de crise e recessão. Elas aparecem mais em empresas de tecnologia, pois essas tendem a se movimentar e se adaptar mais rapidamente. Empresas de tecnologia buscam capital de fundos de investimento para acelerar seu crescimento, mas, quando uma crise surge, precisam se readequar muito rapidamente. Contudo, downsizing e layoffs não são exclusividade das empresas de tecnologia. A Tyson Foods, uma das maiores empresas de carnes dos EUA, e a Goldman Sachs, empresa global do mercado financeiro, também anunciaram layoffs nessa virada de ano.
Mesmo em cenários econômicos favoráveis, crises também podem ocorrer por motivos internos. Decisões tomadas que não se mostraram acertadas podem causar uma crise em uma empresa, independentemente da influência do cenário econômico. Um exemplo bastante conhecido é o da Enron Corporation, uma das empresas líderes no mundo em distribuição de energia e comunicações, que faturou US$ 101 bi em 2000 e, em 2001, devido a fraudes contábeis e fiscais e a uma dívida de US$ 13 bi, pediu concordata. Mais recentemente, temos o caso da Americanas, grande empresa do varejo brasileiro, que esteve em crise no início de 2023 por não ter registrado, em seus balanços auditados, uma dívida de R$ 20 bi.
Como expliquei no artigo “Como devemos gerenciar produtos durante crises“, as empresas devem analisar duas perspectivas, quando percebem que estão entrando em uma crise:
Para a primeira perspectiva — preservar o caixa —, devemos olhar para as causas mais comuns. Devemos buscar preservar, ou até mesmo avançar, os fluxos de receita enquanto analisamos todos os custos com uma lupa. É nessa análise dos custos que entram as ferramentas de downsizing e layoffs que estamos vendo serem aplicadas em muitas empresas de tecnologia e também em empresas não são de tecnologia, como os exemplos que comentei acima (Enron e Americanas).
Ao longo de minha carreira, já passei por algumas crises e tive que tomar decisões de redução de time. Mais recentemente, como advisor, tenho também ajudado alguns heads de produto e CEOs em suas decisões e no planejamento de layoff.
Não vou entrar aqui na parte de gestão de pessoas desse processo, pois há muitos artigos bons sobre o tema, dando detalhes do que fazer e do que não fazer. Nesse aspecto, minha recomendação é usar a empatia para definir a melhor maneira de agir. Se eu fosse demitido, como eu gostaria de ser tratado? Se eu não fosse demitido e ficasse na empresa que passou por um layoff, como eu reagiria às saídas e como eu gostaria de ser tratado? Trabalhe sempre muito próximo do time de gestão de pessoas. Não é incomum ter pessoas nesse time com formação em psicologia, o que pode ajudar bastante no planejamento.
Neste artigo, vou falar sobre a parte do processo de layoff relacionada ao planejamento da redução do time de desenvolvimento de produto. Como diminuir o time? Devo somente reduzir o número de pessoas em todos os squads e manter o mesmo número de squads? Ou devo pensar em desmontar alguns squads? Aqui vão minhas recomendações:
Vou utilizar um caso hipotético para ilustrar esse exemplo e mostrar a ferramenta de desenho de cenários.
A crise chegou e, após análise cuidadosa dos números, você, como líder da área de desenvolvimento de produto da sua empresa, chegou à conclusão, ou recebeu um pedido da pessoa CEO, de que será necessário um layoff, ou seja, você terá que reduzir o tamanho do time e fazer algumas demissões. A redução terá de ser de 40% do seu orçamento.
Você lidera um time de 200 pessoas, sendo o time atual de 180 pessoas, mais 20 vagas. Dessas 20 vagas, 10 são novas vagas e 10 são vagas de reposição. As 180 pessoas estão divididas em 4 tribos de produto e 2 tribos de times estruturais, conforme o desenho abaixo. As 10 novas vagas servem para formar 2 novos squads: o squad Worf, na tribo Star Trek, e o squad Integrações, na tribo de Sistemas Centrais.
Esse time de 200 pessoas está focado em atingir 20 objetivos e seus respectivos resultados-chave (OKRs). Após as conversas com seus líderes e seguindo os passos descritos acima, você poderá criar os seguintes cenários.
Já usei essa tabela de cenários em algumas situações em minha carreira e já a recomendei para heads de produto, de engenharia e CEOs que fazem sessões de advising comigo. Com esses cenários em mãos, você pode agora conversar com a pessoa CEO e outros líderes da empresa para mostrar o impacto da redução, bem como alternativas de reduções menores com impactos também menores na produtividade do time de desenvolvimento de produtos para que vocês possam avaliar as opções.
Ter menos pessoas fará com que a equipe deixe cair algumas bolas, ou seja, é preciso tomar uma decisão sobre o que parar de fazer. Alguns objetivos e resultados esperados devem ser despriorizados, pois teremos que demitir algumas pessoas e a equipe ficará menor. É simples assim. Menos dinheiro implica em equipe menor, o que implica em menos coisas que essa equipe poderá fazer e, consequentemente, menos objetivos poderão ser atingidos e resultados poderão ser alcançados.
Esse artigo é mais um trecho do meu mais novo livro “Transformação digital e cultura de produto: Como colocar a tecnologia no centro da estratégia da sua empresa“, que vou também disponibilizar aqui no blog. Até o momento, já publiquei aqui:
Ajudo empresas e lideranças (CPOs, heads de produto, CTOs, CEOs, tech founders e heads de transformação digital) a conectar negócios e tecnologia por meio de treinamentos e consultoria focados em gestão de produtos e transformação digital.
Na Gyaco, acreditamos no poder das conversas para promover reflexão e aprendizado. Por isso, temos três podcasts que exploram o universo de gestão de produtos por ângulos diferentes:
Você trabalha com produtos digitais? Quer aumentar as chances de sucesso do seu produto, resolver os problemas das usuárias e atingir os objetivos da empresa? Conheça meus livros, onde compartilho o que aprendi ao longo de mais de 30 anos criando e gerenciando produtos digitais:
